Será que os boys precisam passar pelo que Tony Soprano passou para buscar terapia?

 O terapeuta - René Magritte

Um amigo que não é muito amigo do perfeito, sem defeitos - o mesmo que fica perguntando cadê o perfeito para lavar louça, para dançar forró e um monte de coisa mais - se negou a ler a crônica da semana passada por conta do título. Acha uma imposição esse negócio de que temos que fazer alguma coisa. Aquariano, logicamente. Mas, com razão, reclama do meu cigarro. Promete que se eu parar de fumar, vai adiantar dois anos do seu fictício casamento. A gente ama fazer bullying e piadas. É um grupo de uma toxidade engraçada.

Essa semana, por acaso, vi um recorte de uma entrevista com a saudosa Fernanda Young. Meu Deus, como amava e admirava aquela mulher. Às vezes, fico vendo episódios antigos do Saia Justa com ela e ritinha. O mundo mudou tanto desde então e não tenho dúvidas que elas contribuíram um pouquinho de nada com essas mudanças. Mulheres foda sempre estão movendo.

Nesse recorte, Fernanda contava da sua relação com o cigarro. A mãe lhe culpou quando criança pelo pai ter ido embora de casa. Lhe disse: seu pai reclamava da sua tosse, por isso partiu. Na terapia, Fernanda descobriu que começou a fumar ainda adolescente na esperança de o pai voltar para casa; porque se foi pela tosse que ele se foi, de repente, por sua tosse ele poderia voltar. Muita loucura, né?! Isso fica bem enfiado no nosso subconsciente. Só com ajuda profissional podemos chegar lá. E, às vezes, são anos e anos de estrada.

Essa semana, também por acaso, acabei voltando a assistir uns episódios da série Família Soprano. Até que tenho gostado mais. Fiquei pensando, será que meu amigo em negação vai precisar ter um piripaque do chaves para entender que todos precisamos de terapia? Espero que não. Para quem não sabe, o mote da série Família Soprano é justamente a imersão de Tony, um grande cara da máfia, descendente de família italiana, nas sessões de análise com sua psiquiatra. O que lhe levou à terapia foram as crises de pânico.

Num dos episódios, que inclusive povoou meus sonhos e virou pauta da minha análise, ele tem duros embates com a mãe. Ela está com ódio porque ele a colocou para morar num luxuoso asilo depois dela ter incendiado a casa por não ter mais tantas habilidades com o fogão e depois de destratar todas as cuidadoras que o filho contratou. Como chantagem emocional, ela se nega a comer os macarons que o filho lhe levou. Num de meus sonhos, um dos boys que me relacionei contava que iria publicar um livro chamado Thank You, Macarons.

Na época associei o sonho aos relacionamentos que tinha vivido e como eles influenciavam no meu trabalho e também como um reflexo das histórias da minha família. O livro que estou escrevendo, curiosamente, é uma conversa de Olívia com seu terapeuta. A obra foi criada em 2020, bem antes de assistir a série. Interessante essas coincidências. O boy do sonho, no qual ainda cultivava certo apego mesmo após o fim decretado por mim, foi completamente superado com as reflexões feitas através dessa narrativa criada pelo meu subconsciente.

No último episódio assistido de Família Soprano, Tony lembra da sua infância e de uma ocasião quando a mãe não deixou o pai sair da máfia. Depois de ser preso, o pai de Tony recebeu uma proposta para sair de New Jersey, gerenciar um restaurante em Nevada . A mãe de Tony ameaçou sufocar os próprios filhos com um travesseiro caso seu marido concretizasse a mudança. Na série, conseguimos ver o quanto essa mulher, mesmo morando num asilo, ainda tem grande poder de influência sobre máfia local.

Para Tony parece não houve outra alternativa a seguir a mesma estrada do pai. Nesse episódio, relata seu grande temor a sua terapeuta: que seu filho continue nesse caminho, que seja mafioso. Nessa sessão, quando Tony conta desses acontecimentos de sua infância, sua terapeuta lhe pergunta: você não gosta do History Channel? Então, quem não entende a história, está fadado a repeti-la. 

Amigo, é para isso que a terapia serve. Só para gente não ir repetindo de forma inconsciente as merdas históricas. Consegue entender melhor por que todos, de alguma maneira, precisam? Na entrevista, Fernanda Young afirmou algo que concordo categoricamente: fazer um processo analítico é uma necessidade básica. Pena que tão poucas pessoas ainda tenham acesso. Para mim, todos deveriam poder, desde de criança, usufruir desses cuidados. Ainda mais depois do horror que vivemos nesses últimos anos. 


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