Meu bem, se tem uma coisa que não sou é mal amada
Girassois - Van Gogh
Outro tipo de comentário que tenho recebido é esse. De que vendo o perfeito, sem defeitos, o melhor sugador de clitóris já fabricado (link na bio), porque sou mal amada e tenho rancor dos homens. Essa não é uma crônica reclamação. É mais uma crônica reflexão disposta a destruir certas crenças bastante comuns sobre o amor e sobre o que é ser uma mulher bem amada e bem sucedida nessa porra de sociedade.
Bem, acabei de fazer 36 anos e estou, nesse momento, solteira. Obviamente, fracassei na vida. Uso sugadores porque sou uma pervertida viciada em gozar e estimulo mulheres desamparadas a fazer o mesmo. Sendo quem sou, obviamente nenhum homem quis fazer o grande favor de casar comigo. Afinal, quem quer estar do lado de uma megera? Uma bruxa encantadora de clitóris? Não sou a escolhida porque, ao invés de ficar polindo ego de homi, estou aqui lutando por igualdade e, por vezes, só sentando neles. Pobres coitados!
No fim, a maioria homens (não todos, graças a deusa Kali cortadora de cabeça dos sem caráter), querem e buscam mulheres submissas. Já citei o fato de muitos coachs lucrarem infinitamente no mundo do marketing digital com isso. Escolhi em diversos momentos da vida me priorizar. Terminei um relacionamento porque me dei conta que estava atrapalhando meu mestrado. Ou fazia isso ou não teria paz para escrever. Os problemas eram maiores, mas foi a gota d’água. Nessa vida, tenho fracassado porque me neguei a ser submissa e secretária. Ou seria o contrário?
Não há rancor. Apenas percepção do papel esperado das mulheres. Sem consciência, eles buscam mães e não companheiras. Acabamos, também sem consciência, ocupando esse lugar. Marcamos médico, cuidamos da casa, temos todo o trabalho mental de fazer uma relação acontecer e prosperar. Eu não tenho como estar nesse lugar. Já tentei e não consigo. Vejo com muita dor algumas amigas estarem nele. Por um tempo até fiquei mais fechada a relacionamentos afetivos. Vivi meus processos, me dediquei a trabalhar e a estudar. Busquei e busco autonomia material e emocional.
Mas nasci com vênus em libra. Se tem uma coisa nessa vida que curto é amar e me relacionar. Claro, muito além da perspectiva afetiva/sexual. Só para terem ideia, meu primeiro namorado foi aos 12 anos. Quase enlouqueci minha mãe. Só devo ter aprendido a ficar de boa sozinha há alguns anos. Hoje escolho viver o amor de todas as formas. Não estou fechada a namorar ou casar. Só não faço desse desejo um marcador do meu valor pessoal. Entendo minhas buscas. Não vou projetar qualquer um no lugar do homem desejado. Quero estar com alguém massa. Companheiro de verdade.
Estar solteira (o que, inclusive, é um marcador social usado para oprimir mulheres) não faz de mim ou de qualquer outra mulher fracassada. Tenho orgulho do meu percurso. Uso minha experiência para tentar traduzir questões atravessadas da humanidade. Transformo em literatura, em dramaturgia, em roteiros. A uso para, de alguma maneira, construir pontes para mudanças no meu interior e também no de quem está por perto.
Repito sempre a máxima de que não estamos aqui para servir a ninguém porque ainda nos querem colocar nesse lugar. Quando me chamam de rancorosa é porque não estou servindo. Porque, de alguma maneira, minha voz pode ser ouvida. Quando dizem que não devo falar o que falo querem que me submeta. Sempre fui rebelde. Rebelde com causa. Sirvo o melhor e o pior de mim apenas quando eu sinto vontade. Não quando sou obrigada.
Nesse caminho, o que posso dizer é: se autoconhecer (não só sexualmente falando), não se deixar ser subjugada por padrões sociais e se amar é poderoso e libertador demais. Quer colocar silicone porque você gostaria de um peito maior e acha bonito? Coloca! Sei que há padrões que nos empurram para esse lugar. Mas essa também pode ser sua genuína vontade. Quer casar porque está apaixonada? Casa! Quer terminar uma relação por mais que todos e, principalmente, sua família digam para não terminar? Termina logo! A gente precisa aprender a se ouvir. Qual é seu desejo e vontade?
Não só o prazer nos foi negado. Nos é negado qualquer autonomia. Se aos 36 anos nenhum homem me escolheu é porque não tenho valor, sabe? Não é porque, de repente, escolhi outros caminhos. Não é porque, de repente, sei e respeito o que me move a cada momento. O acesso ao amor não é sobre estar dentro de uma relação afetiva. Não discuto aqui as perversidades do machismo por ser mal amada. É por amar muito e não tolerar violências. É por não querer ver os homens que amo reproduzir atrocidades. Amar é saber dar e receber. É saber quem vale a pena seguir ao nosso lado. E nisso tenho um bocado de privilégio. Amo muito e me sinto muito amada!